Literatura de cordel
A
MORTE NA CANTORIA
Por Paulo Tarciso
Meus leitores
e ouvintes
Um caso aqui
vou narrar
Escutei num
julgamento
Foi num júri
popular
Um fato muito
engraçado
Os nomes serão
mudados
Pra eu não me
complicar.
Foi num sítio
conhecido
Falo da zona
rural
Em noite de
cantoria
Bodega, gente
“aos cambau”
Com viola e
poesia
Bebida, muita
alegria
Todo ia bem
normal.
Em certo e
dado momento
Alguém bate no
balcão
E o dono da
bodega
Fez uma
reclamação
O freguês
então falou:
Pagando aqui
eu estou
Eu tenho
direito ou não?
O bodegueiro
então disse:
Tenha respeito
caboclo
Nós estamos
numa festa
Não quero aqui
alvoroço
Mas o bebum
insistia
Pode parar
cantoria
Não vim aqui
roer osso.
O vendedor do
boteco
Falou com a
cabeça quente:
“rapaz tenha
mais respeito
Não seja tão
imprudente
Se continuar
assim
Eu não
respondo por mim
Nunca temi um
valente!”.
O bebum se
alterou mais
E falou: “Eu
to pagando
Faço aqui o
que quiser
Não fique me
abusando”
Meteu murro no
balcão
Quebrou copo e
garrafão
E ainda ficou
gritando.
Nisso chegam
os seguranças
Contratados
para a festa
Pelo dono da
bodega
Pensou: é
briga na certa
Tentaram tirar
o brigão
Mas levaram um
empurrão
E arranhão na
testa.
Nessa hora os
violeiros
Cantavam no
improviso
Um pergunta
outro responde
Vem alguém
lhes dar um aviso
Vão parando a
cantoria
A briga ali se
fazia
Começo do
prejuízo.
Violeiros
então pararam
Pedro ainda
perguntou:
Porque pararam
a viola?
O dono não
ordenou
Vão tocando
novamente
A festa está
tão decente
E a farra
continuou.
Como apartaram
a briga
Foi voltando a
cantoria:
“Quando eu ia
ela voltava
Quando eu
voltava ela ia”
Noite de lua
encantada
Alguém leva
uma paulada
Começa aquela
agonia.
O nome do
confuzeiro
Eu aqui não
vou citar
Vou chamá-lo
só de “Véi”
Como é
conhecido lá
Empurrou o
balconista
Que deu-lhe um
tapa na vista
Que ficou sem
enxergar.
Começou um
corre-corre
Gente caindo
no chão
Nisso apagaram
as luzes
Aumentando a
confusão
Um bebo caiu
por cima
De uma bela
menina
Ali no pé do
balcão.
Vem chegando
um cunhado
Do dono do
botiquim
Perguntou:
“Que diabo é isso
Que tá havendo
aqui?”
Recebeu uma
bordoada
De uma táboa
quebrada
Que acertou
seu “fucim
Ele foi caindo
ao chão
Gritando, ai,
ai meu pai
Que confusão
da desgraça
Levanta e na
frente cai
Corre-corre,
taboa e prego
Derrubaram até
um cego
Conhecido Zeca
Braz.
Alguém gritou
lá de fora
Furaram seu
Mariano
Parece que foi
o “Véi”
Que tava ali
perturbando
Outro veio
separar
Levou um corte
por lá
Foi Quinca de Edvânio.
Pedro Bento ia
correndo
Do salão
daquela festa
Levou uma
cacetada
Que
acertou na sua testa
“O galo” ficou
tão grande
Alguém foi
logo gritando:
“Ô pancada da
mulesta”.
Nisso Maria
Pavi
Foi correndo
em disparada
Enganchou o
seu casaco
Numa cerca na
calçada
E o arame
farpado
Foi ali
entrançado
Naquela blusa
estampada.
Nisso Cico do
coqueiro
Disse: Eu vou
é socorrer
O homem
esfaqueado
Não posso
deixar morrer
Levou uma
cipoada
Caiu ali na
calçada
Vendo as
estrelas tremer.
Disseram que o
tal de “Véi”
Lesionou o
Luizinho
Inda bem foi lesão
leve
Seis dias
ficou bonzinho
Disse: festa
nunca mais
Em casa fico
na paz
Eu quase via
meu fim.
Teve assim o
Mariano
Que foi a
vítima fatal
Levou um corte
nas costas
Morreu ali no
local
Acusado
processado
Para o júri
foi levado
Julgamento ao final.
O promotor
requereu
Para ouvir lá
no plenário
Testemunhas
presenciais
Que viu sim
todo cenário
Estas foram
conduzidas
Em depoimento
ouvidas
E as oitivas
encerradas.
O Juiz deu a
palavra:
“Que comece
acusação
Terá uma hora
e meia
Pra fazer a
explanação”
Assumiu o
promotor
O tempo todo
ele usou
Para a sua
alegação.
Encerrada a
palavra
Pediu a
condenação
Por morte
qualificada
Outro foi
acusação
De homicídio
tentado
Um homem foi
lesionado
Mas morte era
a intenção.
O juiz então
passou
Palavra para a
defesa
Dr. DANIEL
assume
A tribuna e
foi à mesa
E um a um dos
jurados
Tinha o nome
decorado
E começou a
peleja:
Ele disse,
vamos ver
Como o fato
aconteceu
Vocês ouviram
um lado
Vão ouvir
agora o meu
Foi noite da
cantoria
Pra ser noite
de alegria
Mas como o
fato se deu?
Foi num sítio
na bodega
E o “dono da
festa” via
Não era só a
cultura
E nem mesmo a
cantoria
Ele visava
dinheiro
O lucro no seu
terreiro
Por isso a
festa fazia.
O coitado do
acusado
Que está aqui
presente
Além de pobre
inda é negro
Pobre coitado,
mas gente
E ele não quis
matar
Apenas quis se
livrar
De um ato
iminente.
Vejam: o fato
ocorreu
Na saída da
cancela
Quando o réu
já ia embora
A lua ainda
era bela
Mas como foi
provocado
Com a faca
estava armado
Fez uso bem
rápido dela.
Se não fizesse
a defesa
Hoje tava era
enterrado
Seus jurados
esse homem
Já está
encarcerado
Já faz quase
quatro anos
O seu voto é
soberano
Absolvam esse
coitado!.
Encerrados os
debates
Veio, enfim, a
votação
O réu foi
absolvido
Daquela
acusação
Mas da noite e
cantoria
Quando lembra
se arrepia
Não quer nem
recordação.
Paulo Tarciso Freire de
Almeida
Buique-PE.
Escrito em 21.06.2017
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